Hoje vou contar para vocês como foi o processo de reconhecimento da minha cidadania italiana.
Para começar o processo é preciso se dirigir ao comune, levar os documentos e verificar o que o ufficiale dello stato civile (seria tipo um tabelião dos cartórios do Brasil) ou anagrafe (responsável pelos pedidos de residência) querem fazer primeiro (se não for a mesma pessoa), porque aqui tem duas questões. O responsável pelo processo de cidadania só pode começar o processo quando tivermos a residência confirmada, mas nós só podemos fixar a residência se tivermos direito à cidadania. Então teoricamente, o mais correto seria, o responsável pelo processo da cidadania (stato civile) analisar os documentos, declarar que está tudo certo (que não tem impedimentos) para o responsável do registro da residência (ufficio anagrafe) e depois poderíamos pedir a residência, e quando fosse confirmada, poderíamos levar os documentos (de novo) para começar o processo. Uma confusão (eu sei), mas é assim. Então depende de cada comune e (vontade de trabalhar) do funcionário. Depende também se o comune é grande ou pequeno, se for pequeno normalmente é a mesma pessoa.
No post anterior sobre a “minha jornada no sul da Itália” comentei que conseguimos alugar um apartamento com MUITA (mas muita) dificuldade (tanta que até cogitamos em mudar de comune). Fomos visitar apartamentos nos comunes vizinhos (que por coincidência a esposa de um dos proprietários era brasileira), mas no fim das contas conseguimos encontrar um apartamento na cidade que queríamos desde o começo, mas que só nos foi alugado porque eu falei para o proprietário que se ele precisasse de ajuda para falar inglês ou português com os clientes do hotel dele que eu ajudaria sem problemas, já que ele não falava inglês e precisaria de ajuda quando o verão chegasse.
Com o contrato de aluguel registrado em mãos (eu fui pessoalmente na Agenzia delle Entrate e tive que pagar 200 euros) e com a autorização do proprietário (obrigatória), fizemos o pedido de residência no comune e depois tivemos que esperar a visita do vigile (guarda municipal que vem na nossa casa se certificar que moramos realmente lá e que a casa é idônea para ser habitada). Ficamos esperando vários dias, mas como eu estava com pressa para começar o meu processo (queria terminar entro três meses para não ter que pagar o visto), pedi para o dono da casa ver se alguém na cidade conhecia esse tal de vigile, assim poderia pedir pra ele passar logo. E não é que o cara conhecia um e me fez esse favor (sorte né?).
A VISITA DO VIGILE
Quando ele chegou eu perguntei se ele queria um café e se ele queria ver a casa, ele disse que não e se sentou na cadeira da cozinha mesmo. Me pediu para ver os nossos documentos, o contrato de aluguel registrado e me fez várias perguntas (que infelizmente não me lembro). De qualquer forma, nestes casos é melhor responder SOMENTE o que ele te perguntar, evite falar mais que a boca para não se prejudicar. Enfim, ele pediu para a gente assinar um papel e disse que iria registrar a nossa residência nos próximos dias.
O MEU PROCESSO DE RECONHECIMENTO
Quando a nossa residência foi confirmada, levamos os documentos ao Comune para começar a prática e lá tivemos outra surpresa... A funcionária começou a chorar, falando que ela estava cansada, cheia de coisas para fazer e que não poderia fazer nada naquele dia para nos ajudar. Eu fiquei chocada, mas tentei me lembrar de todas as dicas do Fabio Barbiero (apesar de eu ter pulado uma muito importante, que era entrar em contato com o Comune antes de vir para a Itália, que por sinal eu recomendo que vocês façam isso como ele falou), então eu tentei ficar calma e perguntei se eu poderia fazer alguma coisa para ajudá-la, mas ela disse que não e para eu voltar outro dia. Voltei poucos dias depois e (adivinha?) descobri que ela pegou uma licença sem tempo determinado para voltar porque não estava (psicologicamente) bem. PÂNICO (nunca pedi tanta ajuda à Deus na minha vida). Perguntei se alguém ali no Comune tinha competência para me ajudar e para substituir a mulher, e tive sorte que tinha um rapaz que tinha entrado ali para ajudá-la e ele foi MUITO legal com a gente. Me pediu ajuda para saber o que ele precisaria fazer, e como eu estudei TUDO o que o Fabio ensina consegui guiá-lo, mas muita coisa ele também já sabia porque estudou para conseguir esse cargo e isso é uma das funções deles né. Os consulados responderam muito rápido o e-mail dele, se me lembro bem, tivemos que esperar uma ou duas semanas somente. Depois disso o problema foi outro (que eu também não sabia quando eu escolhi a cidade)... Na cidade não tinha o Prefeito (que é quem assina os documentos finais do processo para que o funcionário possa fazer a transcrição dos nossos documentos), que foi afastado não sei por qual motivo, então no lugar dele tinham 3 “policiais/oficiais” que poderiam assinar.
Como nada foi fácil até aqui, porque deveria ser no final, não é mesmo?!
Os tais “oficiais” não queriam assinar, porque eles ouviram falar que tinham vários brasileiros vindo para a Itália com documentos falsos para conseguir o reconhecimento da cidadania. A minha sorte é que o funcionário do Comune estava do meu lado da história, até porque ele fez o trabalho dele bem feito, verificou todos os meus documentos, confirmou tudo com os consulados italianos no Brasil, então não tinha motivo para que eles desconfiassem de mim ou dele (que ficou muito ofendido com isso).
Então, como o meu prazo de 90 dias estava acabando, eu decidi ir lá bater na porta dos “oficiais”, mesmo que eles não tenham me chamado. Eles me fizeram esperar um pouco e depois quando me fizeram entrar começaram a fazer várias perguntas (do tipo: por que escolheram essa cidade? Por que a Itália? Por que querem morar aqui? Se a gente trabalhava ou estudava e tantas outras coisas que não lembro porque eu estava muito nervosa), mas eu consegui responder tudo com muita segurança, até porque eu tinha feito tudo certinho e não tinha nada a temer.
No final eles acreditaram em mim e na minha irmã, então falaram que iriam assinar tudo. Infelizmente meu prazo de 90 dias estava acabando (e eles sabiam da data porque me perguntaram), então eles só assinaram os documentos UM DIA DEPOIS de nós pagarmos uns 100 euros cada uma pelo visto (permesso di soggiorno). Eu poderia ter esperado? Não, porque eu não iria arriscar todo esse sacrifício para ser mandada embora do país por estar ali ilegal, mesmo que por poucos dias.
Saímos de lá com uma vontade de chorar, mas sabíamos que tudo iria dar certo.
Depois que eles assinaram tudo, o funcionário do Comune me ligou para me avisar disso e que ele estava transcrevendo os documentos, que nos próximos dias iria nos ligar para a gente ir lá pegar as nossas cópias e solicitar os nossos documentos de identidade.
Fomos buscar nossa certidão de nascimento em italiano (foto da capa do post) e foi O DIA MAIS FELIZ DA MINHA VIDA. Nunca lutei tanto por alguma coisa e a sensação de conseguir realizar esse sonho não tem explicação e nem preço que se pague.
Até por isso que agora trabalho para fazer parte disso, em buscar os documentos para as pessoas ou fazer a pesquisa para quem não sabe a origem da própria família. Quero que todos possam sentir o que eu senti, é libertador, um sonho realizado mesmo!
Se ficou com alguma dúvida ou quiser compartilhar a sua história comigo, deixa aqui nos comentários.
Um abraço e até a próxima.
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